28/02/2015

Sobre o meu mês de Fevereiro

A perda da minha avó, uma das pessoas que mais adorava na família, deixou-me devastada. Tive que voltar a casa. Foram dias negros, pesados e de muitas lágrimas, em que as horas passaram mais devagar do que nunca. Mas a vida teve que continuar.
Mesmo depois de o choque passar e de as coisas acalmarem, continuei a deixar o blog em suspenso. Andei cheia de coisas para fazer, para além de que, sinceramente, nem sequer senti vontade de cá vir. Até nestes últimos dias nem tenho tido grande vontade para cá vir. Tenho optado por gastar o meu tempo noutras coisas para além de ler blogs, e, nos últimos dias, senti isto um pouco morto e foram raros os posts em que me apeteceu deixar um comentário. Há alturas em que isto consegue cansar-me. Acho que não virei cá com tanta frequência tão cedo, até porque vou ter outras coisas para fazer e outras nas quais prefiro focar-me.
De qualquer maneira, e continuando o meu relato... Tive que regressar ao Porto para encaixotar toda a minha tralha e devolver a chave do apartamento. A minha mãe foi comigo, o que foi uma grande ajuda. Arrumámos tudo num instante e ainda tivemos tempo de dar uma volta no centro comercial. Mas foi só. Dois dias depois, teve que se ir embora para não continuar a faltar ao trabalho, e eu também tive que me ir embora, uma vez que já estava tudo arrumado. Tive pena de não ter conseguido despedir-me do Porto como devia ser: dar uma volta pela baixa, ir a mais um ou outro sítio, comer um lanchinho gostoso no Moustache... Espero voltar lá um dia. Já soube que não tenho necessariamente que ir ao Porto para entregar o trabalho final do curso e que o posso enviar por correio, mas, aqui entre nós, preferia que me tivessem dito que era obrigatório entregá-lo presencialmente...porque ao menos tinha uma desculpa para lá voltar. Mas talvez vá mesmo lá entregá-lo...quem sabe.
Tinha pensado passar uns dias em Lisboa antes de voltar de vez para casa, mas, com tudo o que aconteceu, fiquei um bocado reticente. Mas a minha mãe disse que era algo que me faria bem, pelo que acabei por ir.
Fiquei em casa da minha irmã, e depois em casa do meu namorado. Dias de descanso, finalmente, depois de tantos dias enfiada em casa a estudar. Soube que passei a todos os exames na época normal - e com as melhores notas de sempre - e escolhi o tema do trabalho final do curso. E é muito giro. Uma das coisas que mais me fascina na área da nutrição é a possibilidade de se reverter uma doença ou de proteger o organismo de uma doença através dos alimentos, sem necessidade de se recorrer a fármacos. Mas, mais do que saber que determinado alimento pode combater determinada doença, gosto de saber o porquê ou o como de isto acontecer. Isto é, o que é que determinado alimento tem e de que forma é que aqueles compostos interagem com o nosso corpo de forma a combater uma doença. A minha orientadora disse-me que o mais importante era que eu escrevesse sobre algo de que gostasse, pelo que estou mesmo contente com o meu tema (que, para já, não vou revelar). Perdi um dia de férias a pesquisar artigos para o trabalho, e, quanto mais pesquisava, para além de mais coisas encontrar, mais entusiasmada ficava com o assunto. Olhando para trás, ainda bem que perdi esse dia, pois, se ainda não tivesse feito a pesquisa por esta altura, estávamos mal.
As férias não foram nada de extraordinário, exceptuando os dias que eu e o namorado fomos passar a Coimbra. Foi muito bom mudar de ares, desanuviar e conhecer um lugar novo. Só tenho pena que não tivéssemos feito isto mais vezes.
Depois, foi altura de voltar a casa. Já comecei o estágio, e, até agora, até estou a gostar. Tenho alguns tempos mortos que são um bocado aborrecidos, mas aproveito-os para ler alguns artigos que encontrei para o trabalho final, para tentar adiantar alguma coisa. Mas o estágio em si está a correr bem; não sei porquê, tinha uma ideia diferente daquilo que iria fazer, pelo que está a superar as minhas expectativas (pelo menos por agora; esperemos que não piore). E como é bom não ter aulas nem coisas para estudar! O problema é que tenho chegado a casa sempre um bocado cansada e sem vontade de fazer nada, até porque chego a uma hora à qual a minha cabeça já não funciona (perto das cinco da tarde), pelo que trabalhar na tese depois de chegar a casa é algo no qual nem sequer penso. E eu que queria voltar a praticar natação...estou a ver que não vai ser desta, até porque os horários das piscinas no que toca a natação livre são péssimos.
E fico por aqui no que toca a actualizações. Acho que vou passar a levar este blog mais na desportiva, sem dar grande importância ao facto de receber ou não receber comentários e a passar a vir cá somente quando me apetecer - tal como fazia nos meus primeiros tempos como blogger. Não que isto fosse uma obrigação, mas costumava cá vir todos os dias, nem que fosse só para ler o que se andasse a passar. Agora, bem, isto ficará lá para segundo ou terceiro ou quarto plano.

27/02/2015

Seis

Acho que posso dizer que a minha vida deu uma certa reviravolta há seis anos atrás. Uma boa reviravolta. Nem sei como estaria se não tivesse acontecido.
Por um lado, ganhei um melhor amigo, um confidente, alguém com quem posso contar seja para o que for e a quem não tenho receio de dizer o que penso. Por outro, tornei-me capaz de me importar realmente com alguém, de ser carinhosa e de imaginar um futuro em que não me visse sozinha. Ainda por outro lado, vivi dezenas de bons momentos. E, ainda por outro lado, descobri o que é o amor, o que é a felicidade, o que é ultrapassar obstáculos em conjunto e crescer em conjunto.
É incrível como uma pessoa que, a princípio, não passa de um completo desconhecido consegue ter tão grande impacto na vida de outra com o passar do tempo.
Mais um ano. Seis anos a conhecermo-nos, a evoluirmos, a aturarmo-nos nos bons e nos maus momentos, a partilharmos tudo e mais alguma coisa, a criar bonitas memórias. E que se mantenha sempre assim, ou que seja ainda melhor nos próximos anos que virão, se tal for possível 

25/02/2015

Avó

Há algumas coisas que é melhor iniciar do que recusar, mesmo que o fim possa ser triste.
in O Senhor dos Anéis: As Duas Torres

Eu vivo num primeiro andar. E ela vivia no rés-do-chão, numa casa mesmo por baixo da minha. Eu não tinha aquela coisa do dia de fazer a visita à avó. Ela estava mesmo ali, e eu via-a todos os dias. Bastava descer as escadas, que ela estava sempre disponível para o que quer que fosse, só para nos ver felizes, nos fazer sentir bem e garantir que não nos faltava nada. E, mesmo que não descesse as escadas, ela acabava por subi-las. Subia-as a cantarolar sempre a mesma canção, vinha trazer o pão e o jornal e ficava um pouco para dois dedos de conversa.
Quando eu não estava cá, ela telefonava-me de vez em quando e ficava sempre toda contente depois de cada telefonema, mesmo que não falássemos sobre nada de especial. Ficava igualmente contente quando lhe dizia as minhas notas dos exames. Orgulhava-se. Parecia contar os dias para o meu próximo regresso, pois, de todas as vezes que falávamos ao telefone, dizia-me quantas semanas faltavam para eu voltar. E, sempre que voltava, fosse a que horas fosse, lá estava ela, acordada à minha espera atrás da janela, enrolada no seu robe vermelho. Todos os domingos, almoçávamos lá em casa, e ela tinha o cuidado de preparar pratos que eu não costumava comer lá fora e que ela sabia que eu adorava: o seu arroz de marisco divinal e as melhores cavalas assadas do mundo.
Enchia-me de orgulho ver que, a um passo dos oitenta, ela continuava a fazer a sua vida normal e que não era como tantas outras da sua idade. Andava sempre bem-disposta, cheia de vida, disposta a viver por muito mais tempo. Não era uma senhora doente, a arrastar-se pelos cantos sem forças para nada e à espera de morrer. Era precisamente o contrário. Ela só queria mais anos de vida, e foi por isso que se submeteu a uma operação ao coração, para a qual foi cheia de confiança e felicíssima. Porque pensava que tudo ia correr bem e que ia ficar a "chatear-nos" durante mais anos. Todos nós pensávamos que tudo ia correr bem.
Não me lembro de alguma vez ter chorado tanto. Tinha tido um mau pressentimento devido ao facto de a operação ter sido adiada tantas vezes; parecia um mau sinal. Achei que lhe devia ter dito que saísse daquele hospital enquanto pudesse, por causa daquele meu mau pressentimento. Senti-me tão triste por ter sido logo agora; logo agora que estava prestes a voltar para casa de vez, prestes a passar mais tempo com ela depois de tantos meses entre cá e lá. Senti tanta repulsa pelos médicos, que, em vez de salvarem vidas, parece que só são capazes de as destruir, por gostarem de brincar ao "corte e costura". Senti repulsa pelo Deus a quem ela tanto rezava e no qual depositava tanta fé e tanta esperança, por não lhe ter dado a força que ela tanto queria e por ter decidido que o melhor seria levá-la. Se é que este Deus realmente existe. Seja como for, não deixou de ser irónico. Ela só queria mais anos de vida. E isso levou-a. Muita gente é da opinião de que, se ela não tivesse sido operada, as coisas podiam ter corrido mal de qualquer maneira, e ela acabaria por nos deixar na mesma. Mas eu sei lá. Eu pensava que, agora que estava prestes a regressar, iríamos continuar com os nossos almoços aos domingos e que eu iria parar em casa dela todos os dias depois do estágio, para lhe contar como tinha sido o meu dia. Pensava que lhe ia telefonar logo a seguir à defesa da tese, para lhe dizer qual tinha sido a minha nota. Ou que estaria lá em qualquer outro momento importante, ou mesmo em simples reuniões de família. Pensava que ela iria continuar presente por mais tempo e que tudo permanecesse igual. Mas nada vai ser como era. A sua presença era qualquer coisa, e é tão difícil traduzir, por palavras, a ligação que estabelecia com todos nós. Agora, sempre que vou a sua casa, acho-a demasiado vazia, mas, mesmo passado um mês desde que nos deixou, fico sempre com a estranha (e estúpida) sensação de que ela ainda vai voltar, como se se tivesse, simplesmente, ausentado. Às vezes, ainda penso que vai subir as escadas, a cantarolar a mesma canção de sempre, para vir conversar um pouco. Faz tanta falta, demasiada falta.
Orgulhava-me olhar para ela. Ver que a idade pouco lhe afectava; que continuava a conduzir, a ir fazer as suas compras, a organizar jantares de família, a arranjar-se. Era das senhoras mais vaidosas e bem arranjadas que conheci. Proporcionou-me muito, muito boas recordações. Andava sempre alegre e a irradiar boa-disposição, cheia de vontade de viver. Mostrou-me que o verdadeiro amor existe, por ter passado quase uma vida inteira ao lado da mesma pessoa. Admirava a sua garra, a sua força e o modo como abraçava a vida. E é assim que vou sempre recordar a minha avó 

PS: Obrigada a quem me deixou mensagens de força. Força foi algo do qual precisei bastante.