23/09/2017

"I'm just a kid and life is a nightmare"

Desenho da minha autoria.

Nunca quis tanto que um Verão acabasse. Este foi o pior que alguma vez tive.
Desde que assinei contrato de trabalho, no início do Verão, deixei de ter fins-de-semana, passando a ter apenas direito a um dia e meio de descanso por semana, tal como os restantes funcionários da maldita empresa onde trabalho. Passou a ser um só dia a acordar sem o despertador, um só dia completamente livre e uma só noite em que não tenho que me preocupar com a hora a que me vou deitar. Para além disso, andei a fazer horas extra todos os dias. Sair depois das cinco ou das seis - quando o meu horário seria, supostamente, até às quatro - acabou por se tornar normal. Conto pelos dedos as vezes em que fui à praia, e os dedos de uma mão são suficientes - e ainda sobram - para contar as vezes em que saí à noite com amigos; não dei um único passeio digno de Verão nem fiz outras quantas coisas que tinha planeado; e, claro, não tive férias. Estas, aliás, nem vê-las até ao próximo ano. Cheguei a casa cansada, todos os dias. E, em muitos deles, também irritada. A ponto de não ter vontade de fazer nada. Por vezes, nem no meu dia de folga me apeteceu fazer alguma coisa; parecia que o cansaço da semana toda estava acumulado, pelo que nem sair de casa me apetecia. Continua a acontecer, aliás. E toda esta irritação e este cansaço não têm apenas a ver com isso e com o facto de eu achar que isto - não ter fins-de-semana, ter apenas um dia e meio de descanso e não ser permitido tirar férias no Verão - não é vida para ninguém. Tem a ver, também, com o trabalho em si.
Cada vez mais, detesto o meu trabalho e detesto aquele lugar. Fico irritada, respondo mal, isolo-me, fico com vontade de chorar e de mandar tudo para outro lado. Há dias em que conseguem fazer-me rir e em que consigo conversar como uma pessoa normal e brincar com as pessoas, mas acho que isso não passa de um disfarce. E existem outros dias em que tudo vem ao de cima e tudo transborda. Dias em que chego mesmo a chorar no meu local de trabalho. E não só por causa do trabalho em si.
Com a irritação no trabalho, tudo o resto vem por acréscimo. Penso no quanto estou arrependida por ter tirado este curso; pergunto a mim própria por que raio o tirei e não desisti logo. Penso no quanto não quero trabalhar nesta área. Penso no maldito exame à Ordem e em como não quero passar por isso outra vez. Com isto, começo a pensar que só andei a perder tempo, que fiz tudo isto e passei por tanto para nada, que ando a desperdiçar a minha vida toda. De facto, os dias passam por mim e eu nem dou por eles; os meses passam, as estações passam, as festividades passam, e eu nem dou por nada disso e não tiro proveito de nada disso. Penso em como quero mudar de vida e no quanto quero deixar de trabalhar ali, mas depois a ansiedade apodera-se de mim com toda a força e sinto-me sufocada e pressionada por ter que pensar naquilo que irei fazer depois. Porque não tenho nenhum plano; só sei que não quero esta vida para mim e que quero sair daquele lugar. Mas, ir para onde? Fazer o quê? São perguntas às quais não sei responder, e isso deixa-me mais ansiosa e irritada do que o que gostaria. E penso que não há nada que queira fazer. Que não há nada de que goste. Que não tenho jeito para nada. E que, portanto, não valho nada. Que ando a viver sem rumo, sem um sonho, sem nada pelo qual lutar. Que só ando a desperdiçar tempo, e que, assim, a vida não faz qualquer sentido.
Muitas das vezes, consigo chorar sem ninguém se aperceber. Mas já fui apanhada. E, mesmo que não chegue ao ponto de chorar, há quem note as minhas diferenças de comportamento. Em ambos os casos, as pessoas perguntam-me o que se passa. Pedem-me para falar. Mas não falo. Não serve de nada falar com pessoas que nunca irão compreender, para além de ser um tipo de conversa que dispenso ter no meu local de trabalho. Mas, apesar de achar que ninguém compreende, há alturas em que gostava de poder falar. Pois ando angustiada há semanas, sem poder falar com ninguém e sempre à espera da próxima consulta com a psicóloga - que, por acaso, acho que também não compreenderá.
Parece-me, no entanto, que toda a gente me vira as costas. Dirijo-me subtilmente àqueles que considero amigos, perguntando se querem ir dar uma volta, se querem sair, se querem ir tomar um café. Não entro à força toda, dizendo que preciso de desabafar, porque...bem, porque não. Porque é parvo. Porque acho que assusta as pessoas, afasta-as ainda mais porque têm mais com que se preocupar do que com os problemas dos outros. E dão-me respostas vagas, como Depois combinamos, ou não respondem de todo. E eu continuo angustiada. Mais angustiada ainda, achando que, afinal, não são assim tão meus amigos ou que eu apenas pensava que o eram. Mas já devia saber que seria assim. Por alguma razão, nunca ninguém quer a minha companhia. Já estou habituada a isso. No entanto, não deixa de ser doloroso estarem sempre a relembrar-mo.
E aí vêm novos pensamentos. Achar que não tenho ninguém com quem contar. Que nunca terei amigos a sério. Que nunca vou encontrar alguém que goste de mim. Em relação a este último ponto, já me mentalizei. E pensar nisso só me leva a crer que nunca mais serei feliz.
Acho uma estupidez pensar que só se é realmente feliz com outra pessoa, e não queria nada ser daquelas tristes que só se sente feliz assim, com alguém. Mas, vendo bem, parece que é esta a verdade. Parece que toda a gente é irritantemente feliz por ter alguém, e que a vida só faz sentido e é bonita desta maneira. Olhando para trás, apercebo-me de que a última vez que me senti feliz foi quando estava com alguém. Portanto, aí está. Por causa disto, ver casais apaixonados irrita-me. Ouvir músicas que falam de amor irrita-me. Ouvir os meus colegas de trabalho falar das suas vidas de casados ou de quase casados irrita-me. Já nem consigo ver filmes românticos que terminem num "felizes para sempre".
Ainda com todos estes pensamentos na cabeça, chego a casa. E, mais uma vez, tudo se abate sobre mim. Não sei o que fazer quando estou em casa; não há nada para fazer. E, muitas das vezes, o cansaço e o desinteresse são tão grandes, que dou por mim a desperdiçar tempo outra vez. A não fazer literalmente nada. Ou a chorar, sem ninguém se aperceber. Por detestar a minha vida, por achar que fiz tudo errado até então, por desejar voltar atrás no tempo, por só ver um negrume à minha frente.
Pode haver quem diga que não passa de uma fase, mas não acho normal que uma "fase" dure praticamente um ano. Pode haver quem diga que todos temos dias assim, os chamados "dias maus", mas não acho normal esse desequilíbrio tão grande entre "dias maus" e dias normais. Não acho normal uma pessoa não conseguir passar dois ou três dias seguidos sem chorar, sem achar que cada novo dia é um sacrifício, sem se perguntar a si própria que raio está a fazer aqui.
Às vezes, pergunto-me se não seria melhor se desaparecesse.